Trabalhava muito, chegava muito cansado em casa, mas era muito feliz. Eu tinha me casado a 3 anos com a mulher mais linda do mundo, a amava mais que tudo e passaria o resto de minha vida ao seu lado. Era fim de mês, e a empresa na qual trabalhava tinha se tornado o inferno de todos os fins de meses, isso era o sinal que eu chegaria em casa mais cansado que o normal, mais estressado que o normal.
Entrei na garagem, tirei as coisas do carro e entrei em casa. Coloquei as chaves no mesmo lugar de sempre e a vi na cozinha, preparando nosso jantar e cantarolando nossa musica preferida. Beijei-a e dei boa noite, ela estava mais linda do que nunca e por um instante percebi que escondido por trás do sorriso que me cativava havia resquícios de tensão. Ela não conseguia me esconder nada, sempre fui um grande observador.
- Algum problema, Mary?
- Não meu amor, tudo tranquilo. - E seu sorriso dissolveu minha desconfiança. Eu deveria estar muito cansado.
- Tudo bem, vou tomar banho. Hoje foi um dia daqueles no trabalho, estou realmente muito cansado.
- O jantar fica pronto em minutos, não demore.
Subi rapidamente as escadas, queria um banho quente e uma roupa limpa. Naquela noite eu não dormiria tão cedo, estava cheio de processos pra ler e por mais que eu quisesse dormir muitas horas seguidas não podia adiar a leitura.
Me arrumei e fui pra mesa de jantar, eu estava com fome e tinha percebido isso enquanto tomava banho.
- Como foi seu dia, amor? - Mary perguntou.
- Cansativo, estou cheio de processos pra ler e não posso adiar esse trabalho.
Continuamos uma conversa banal, que na maioria das vezes eu dava importância, mas hoje não era meu dia. Terminei de comer e ajudei Mary a tirar a mesa, como de costume.
- Amor, eu já vou subir, começar logo a ler aquela papelada, espero terminar ainda hoje.
- Tudo bem, Madson. Daqui a pouco eu também subirei quero dormir logo. - A tensão voltou ao seu rosto.
- Amor, ta tudo bem mesmo? - Fiquei preocupado.
- Claro. - Num tom indiferente ela continuou a lavar a louça.
- Já que é assim, estarei lá em cima, qualquer coisa é só chamar.
Já no quarto, sentei na poltrona e me pus a ler pilhas e pilhas de papel. As horas passaram rápido e quando olhei o relógio fui tomado pelo susto, já era mais de meia noite. Procurei Mary no quarto e ela já estava na cama, dormindo tranquilamente, mas eu não havia escutado ela entrar, nem se deitar. Voltei ao trabalho, mas uma hora se passou sem eu ao menos sentir, eu teria percebido se Mary não tivesse gritado:
- Quem esta ai? - Sua voz estava tremula e ela estava mais pálida que o normal.
- Quem o que amor? - Eu não estava entendendo nada.
- Eu vi um homem dentro da casa. - Ela estava com muito medo em sua voz.
- Hã? Onde amor? - Vi que ela apontou para a porta do quarto que estava aberta. - Você tem certeza que foi real? Pode ter sido apenas um sonho. - Eu já estava ao seu lado tentando acalmá-la.
-Não! - Ela quase gritou. - Não foi um sonho, eu vi. E ontem à noite eu sonhei com isso, ele vai te matar.
- Viu amor, é um sonho! Você esta só impressionada com o sonho da noite passada. Se acalme, meu anjo.
- Não é mesmo um sonho. - Uma voz masculina e desconhecida penetrou em meus ouvidos. - Madson Stuart, o melhor advogado da cidade. - Seu riso congelou minha mente.
- Ela esta armado, amor. - Mary sussurrou puro medo.
- Calma amor. - Sussurrei na tentativa frustrada de acalmá-la e me acalmar.
- Pode parar de cochicho ai. - Ele alertou. - Você se lembra de mim Madson?
A voz cortante atravessou o quarto, mas eu não tinha visto seu rosto ainda, estava de costas para ele. Virei-me cuidadosamente e o fitei pela primeira vez. Era um sujeito asqueroso do qual não me recordava.
- Tribunal Federal. Isso não te recorda nada?
‘’Ah, meu Deus!”Foi tudo que eu consegui pensar. Eu havia contribuído para a condenação daquele sujeito.
- John Fuller. Esse é o seu nome não é? - Perguntei, mas tinha certeza da resposta.
- Você o conhece? - Mary perguntou assustada.
- Cala a boca! - O sujeito gritou.
- Não falei assim com ela! - Rebati completamente exaltado.
- HaHaHa. Grita comigo de novo que eu te mato! - Ele me ameaçou. - Sim, eu sou John Fuller, condenado a 20 anos pelo seu marido, Mary Stuart. - Ele se direcionou a minha mulher.
- O que você quer? Você quer dinheiro? Nós te damos dinheiro, me diga quanto. - Minha mulher já estava no ápice do desespero.
- Vocês estão de palhaçada comigo? Vocês acham que eu vinha aqui pedir dinheiro, pra depois que eu ir embora vocês mandarem a Policia atrás de mim? Vocês acham mesmo que eu tenho cara de otário não é? - Ele estava visivelmente com raiva.
- Não, não foi isso que ela quis dizer. - Tentei reverter a situação.
Ele começou a andar de um lado pro outro transmitindo nevorsismo. Tinha alguma coisa errada com ele.
- Você não era culpado, não é mesmo? Não foi você! Não foi você que matou ela. - Afirmei.
Seus olhos me fuzilaram brilhantes. John estava quase chorando, tive medo, pois não sabia se era de medo ou de raiva. Eu estava arriscando demais, afinal ele estava armado.
- Eu a amava, muito mais do que você ama sua mulher. - Ele me olhou fixamente. - Você não sabe o que é perder a melhor parte de si, ela era o meu melhor e ele tirou isso de mim, e você me culpou de ter matado o meu melhor! - Ele chorava. - Eu passei 20 anos esperando por esse momento e pensando nas varias maneiras de te matar. Pensando no que eu ia dizer, pensando na melhor, quer dizer, pior maneira de te devolver a dor que você me causou. - Ele fez uma pausa, talvez tentando se recompor. - Foram os piores anos da minha vida.
- E quem era ele? Quem a matou? - Perguntei.
- Peter James, o ex dela.
- Onde ele esta agora? Você sabe?
- Eu o matei! Antes de vim pra cá.
- Porque você fez isso? A gente poderia resolver isso de outra maneira John.
- A gente? Da ultima vezes que você resolveu alguma coisa, eu passei 20 anos enjaulado. Eu já resolvi tudo Madson e como já diziam se você quer fazer direito faça você mesmo. - Ele colocou a arma na minha direção. - Atira se não eu te mato!
- Eu não John! Eu não vou te matar. Não vai mais haver mortes. - Eu falei tentando aliviar a tensão do momento.
- Eu te dou 3 segundos... 1, 2 ... - John me pressionou.
Então sem me deixar pensar mais, Mary pegou a arma em meu lugar, fechou os olhos e só atirou. O corpo de John caiu diante de nós sem vida e ainda de olhos fechados, Mary disse:
- Eu não agüentaria te perder, você é a melhor parte de mim.
Texto para 45ª edição conto/historia do projeto bloinques.
Beeijo.